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Me desculpa, Bella Swan
Como (muito bem) disse Robert Pattinson em uma entrevista em 2022, já não é mais tão legal assim odiar Crepúsculo.
O ano era 2008 (talvez 2009, minha memória não é assim tão boa), e um livro com uma capa meio esquisita veio parar nas minhas mãos. Nessa época, eu já era uma leitora compulsiva e simplesmente devorava qualquer coisa, de O Cortiço (leitura obrigatória da escola) ao texto original de Dorian Gray; não ligava muito para gêneros, apesar de me inclinar para a fantasia.
O livro em questão? Crepúsculo. Eu não sabia muito sobre a história, para além do que a sinopse (e as pessoas) contavam: uma adolescente se apaixonava por um vampiro gato, e ele se apaixonava de volta.

pinterest: peacheater2010
Eu tinha 14 ou 15 anos, era uma adolescente cheia de complexos de adolescentes, e só tinha sido beijada uma vez, em uma brincadeira de verdade ou desafio. Minhas amigas namoravam ou com meninos da nossa sala, ou com meninos mais velhos, e eu, na minha solidão silenciosa, desejava experimentar o gostinho do amor, mas não qualquer amor. Eu queria o amor verdadeiro, das princesas da Disney, da Blair e do Chuck, da Elizabeth e do Will. Por isso, vocês conseguem imaginar o que aconteceu assim que eu abri o livro.
A partir daquele momento, Crepúsculo dominou toda a minha personalidade. Eu era muito fã da saga daquela autora que não deve mais ser nomeada, mas Edward e Bella passaram a povoar meus sonhos e minha realidade de tal forma, que até comecei a escrever a minha própria história.
Fui dos livros aos filmes, colecionei camisetas e pôsteres, e jurei vingança contra toda e qualquer amiga que ousasse dizer que a Bella deveria ter ficado com o Jacob.

minha cara julgando quem era #teamjacob
Crepúsculo teve uma influência enorme na Marina adolescente; realmente moldou a minha personalidade. Mas eu cresci, é claro, e depois que a gente cresce, mais cedo ou mais tarde, percebe que crescer é uma porcaria, e que nosso eu de 20 anos é muito mais imaturo do que o de 15.
Aos 20, eu já estava no meio da faculdade de direito, estagiava em um grande escritório e me achava o máximo. Tão adulta e superior, que comecei a dar ouvidos para o que as pessoas falavam não só sobre Crepúsculo, mas sobre várias outras “coisas de menina”.
De repente, minhas referências, guardadas com carinho no coração, passaram a ser motivo de piada (quem nunca viu o vídeo do Felipe Neto e riu enquanto ele imitava a Bella?). Minhas heroínas eram usadas de exemplo do ridículo feminino, descritas como sem graça, sem sal, chatas, reclamonas, frágeis e muitas outras coisas que não vou repetir aqui.
Hoje, me arrependo de ter escolhido o caminho mais fácil, mas já perdoei a Marina de 20 e tantos anos que, confrontada com as piadas, e a possibilidade de ser diminuída, simplesmente renegou as coisas das quais gostava. Doei meus livros (edições originais da Intrínseca), e passei a concordar com quem chamava a Bella de chata e sem graça, afinal, se todo mundo falava isso sobre ela, deveria ser verdade, né?
A resposta para essa pergunta só veio agora, em 2025, quando cometi a irresponsabilidade financeira de comprar o box comemorativo de 20 anos de Crepúsculo, e comecei a reler os livros com a minha melhor amiga.
Muitos anos depois, está sendo incrível reler a história que, afinal de contas, me fez ser autora, principalmente porque essa leitura me fez (re)descobrir que a Bella não é uma personagem assim tão insuportável. Ela, na verdade, é extremamente humana e apenas reflete os comportamentos e medos de qualquer adolescente.
Eu também choraria no carro se o cara mais gato da escola tivesse feito cara de nojo pra mim no meu primeiro dia de aula em uma escola nova (já chorei no banheiro do trabalho por muito menos), e com certeza me recusaria a me afastar se ele ficasse sorrindo torto pra mim e sendo um bom moço (foi assim que fiquei noiva, por exemplo).
A Bella é só uma menina durante os eventos de Crepúsculo (e no decorrer dos outros livros) que confessa, ao longo da história, que nunca sentiu que se encaixou bem nos ambientes. Ela teve de crescer cedo, e assumir responsabilidades que não condiziam com a sua idade, e em mais de uma oportunidade ela admite que não estava acostumada a ser chamada para sair.
Quem de nós nunca cometeu erros, quando era novinho? Por experiência própria, posso dizer que só não cometi mais, porque não tive a oportunidade (sempre fui certinha e medrosa demais).
Por isso, essa releitura de Crepúsculo não só me fez perceber que eu deveria me desculpar com a Bella, por ter ouvido o que disseram sobre ela durante todos esses anos (em sua maioria, homens), mas para a Marina adolescente.
Nossa sociedade tenta, a todo custo, fazer com que todos que não são homens-cis-het (majoritariamente brancos) sejam ridicularizados e diminuídos pelas coisas que gostam. Eu, no entanto, não vou mais cair nessa.
Amo Crepúsculo, sempre amei e, desde que a Stephenie Meyer não negue nenhum direito fundamental ou cometa nenhum crime, sempre vou amar. Uma parte de mim queria ser a Bella, e talvez eu tenha conseguido isso, a minha própria maneira.
Eu era péssima em educação física, mas hoje sou escritora. Passei a adolescência sonhando com um amor arrebatador, e hoje sou amada por um cara incrível. Também me achava inadequada, mas encontrei um lugar pra mim, nesse mundo enorme e assustador.
Quanto ao sonho de ser uma vampira linda e estonteante? Bom, esse, infelizmente, eu não consegui realizar.
Ainda.
